fonte: Valor Econômico

Cerca 60% dos recém-formados em escolas médicas que participaram do último exame do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo não atingiram o critério mínimo estabelecido pelo Cremesp. Ou seja, acertaram menos de 60% das questões, o que significa que não estão preparados para exercer a profissão.

Nos exames anteriores realizados pelo conselho, a reprovação ficou entre 50% e 55%. A baixa qualidade da formação, especialmente para o Estado mais rico do país, é talvez o sintoma mais preocupante de uma profissão que vê seus salários reduzidos, sua carga horária ampliada e seu prestígio em queda. Por outro lado, os médicos recém-formados constituem a elite do país: dados colhidos de questionários realizados nos últimos anos pelo Cremesp mostram que mais de 80% são brancos e estudaram em escolas privadas, cerca de 70% têm pais e mães com curso superior e em 70% dos casos os estudos foram custeados pela família.

Diante desse perfil, o baixo desempenho dos recém-formados é atribuído mais ao nível das escolas que à formação anterior dos estudantes.

“O grande número de escolas médicas privadas que estão sendo abertas no Brasil nos últimos anos não vem acompanhando um padrão mínimo de ensino, diz João Ladislau Rosa, presidente do Cremesp. “O objetivo dessas escolas é o lucro, o que implica cortes de gastos que vão de professores despreparados à falta de um hospital próprio”, acrescenta.

Embora o Cremesp não divulgue um ranking de escolas, Rosa adianta que as privadas mais novas têm as piores avaliações. O país tem 242 faculdades de medicina e só em 2014 foram abertas 26, das quais 17 privadas. Em cinco anos, quando se formarem as primeiras turmas dessas escolas, estarão entrando 1.700 novos médicos.

O número de profissionais, que cresce mais rapidamente que a população, a distribuição desigual e a precária qualidade do ensino são pontos que preocupam a categoria. O país tem cerca de 400 mil médicos (dados de 2013), com uma razão de quatro profissionais por mil habitantes, não distante de países europeus, que têm entre dois e meio e quatro médicos por mil moradores. Em números absolutos, o país é o quinto do mundo em médicos, representando 4% da população médica mundial.

“O Ministério da Educação, que é o responsável pela fiscalização das escolas, deveria ser mais rigoroso nessa função. Existe no Brasil uma ideia de que faltam médicos e temos um estudo que os médicos são muito mal distribuídos”, diz Rosa.

“Enquanto o município de São Paulo tem quatro médicos para cada mil habitantes, Campinas tem seis. Há regiões no país que têm menos de um médico para cada mil habitantes. Hoje, o Brasil forma 21 mil médicos por ano. Em 2020 teremos três médicos por mil habitantes, mais que suficiente”, detalha. “À medida que vai aumentando o número, estamos trocando a qualidade pela quantidade. Não precisamos de mais médicos, mas de uma política pública que estabeleça uma carreira médica”, afirma.

O Programa Mais Médicos, criado pelo governo para atender regiões desprovidas de profissionais, prevê a contratação de 14 mil estrangeiros, um número que não chega a afetar o mercado diante dos 400 mil médicos em atividade. A preocupação das entidades médicas é com a qualidade de assistência oferecida, já que tais profissionais não são submetidos a exames. “Pela lei, eles são intercambistas que vieram para estudar e se aprimorar, mas estão dando assistência sem condições e sem um acompanhamento”, diz o presidente do Cremesp.